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A sobrevivente

“Nazismo é um câncer que se espalhou pelo mundo”, afirma uma das sobreviventes do nazismo

Reportagem e fotos: Fábio Davidson (março/2005)


Símbolo de resistência e engajamento. É difícil resumir, mas estes são alguns dos adjetivos que podem traduzir o que transmite Cristin Goldberg, que conversou com os alunos no auditório da UNINOVE, Campus Memorial, em novembro de 2004, apresentando a palestra "Histórias de uma Sobrevivente da Segunda Guerra Mundial".

Goldberg nasceu em 1916, na Tchecoslovaquia, país que foi entregue à Alemanha nazista pela Grã-Bretanha e França para apaziguar Adolf Hitler, em 1938. Jovem estudante de Medicina, fez parte de grupos de resistência, foi presa pela polícia nazista – a Gestapo – e enfrentou prisões, inclusive em campos de concentração. Conseguiu fugir algumas vezes e chegou ao Brasil em 1946. Transformou sua história em livros autobiográficos, dos quais quatro já foram publicados. Tornou-se Coronel de Honra da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

O professor José de Almeida Amaral Júnior abriu o evento, apresentando Cristin que, em seguida, falou: “Vocês vão ver quais as ‘qualidades’ de Hitler”, através do documentário “Nazismo Nunca Mais!”. O documentário, organizado por Ben Abraham, escritor e jornalista polonês sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz, que veio para o Brasil em janeiro de 1955, mostras as atrocidades cometidas por Adolf Hitler e o governo nazista na Alemanha. As perguntas iniciais do filme ainda ressoam: “Um gênio ou um louco? Ou Ambos? Um patriota ou um traidor?”.

A história de como um partido formado por um “bando de desordeiros” tornou-se, em pouco tempo, um forte partido com milhares membros, tem suas raízes no final da Primeira Guerra Mundial e as penas impostas a Alemanha no pós-guerra (confira no quadro ao lado, abaixo...). Graças a sobreviventes com o Abraham e Goldberg, é possível ter uma noção da tirania imposta pelo regime nazista. Ao mesmo tempo, é inacreditável tomar conhecimento de que movimentos neo-nazistas renascem em diversos pontos do mundo.

E esses movimentos não estão distantes do Brasil. Há cinco anos, o assassinato do adestrador de cães Edson Néris da Silva, com 35 anos, chocou São Paulo e o país. Ele foi assassinado na Praça da República (centro de São Paulo), na noite de 6 de fevereiro de 2000, pois andava de mãos dadas com seu companheiro. Sua morte foi atribuída a 25 membros de uma gangue conhecida como Carecas do ABC. Em 07 de dezembro de 2003 dois jovens foram obrigados a saltar de um trem em movimento devido suas roupas e cortes de cabelo tipo moicano. Três integrantes do grupo Carecas do Brasil, portando armas de estilo medieval obrigaram os dois a pular do vagão com uma sentença: “Ou pula, ou morre!”. Um deles sofreu traumatismo craniano e morreu depois de ficar oito dias na UTI. O outro sobreviveu, mas teve o braço direito amputado. No início deste ano foi criada dentro da rede virtual de relacionamentos Orkut, uma comunidade intitulada “Odeio Negros”. Como o próprio nome indica, trata-se de uma comunidade na qual seus membros expressam racismo e intolerância.

Movimentos neo-nazistas como os Carecas do ABC e os Carecas do Brasil pregam o nacionalismo, o conservadorismo de costumes e o culto à família e impõe sua forma de “pensar” através da intolerância e da violência. Cristin Goldberg não se conforma com a existência de grupos desse gênero, que acreditam em uma nova forma de nazismo e conseguem disseminar-se. Ela disse que a juventude “não precisa ser sangue de barata, permitindo a existência de grupos nazistas como o de Osasco”. Durante sua palestra, Goldberg contou o que sofreu em sua juventude, como lutou contra o regime opressor e, de forma emocionada, como ama a pátria que a acolheu, o Brasil.

Na prisão, Goldberg conta que em meio a “sopa” oferecida aos prisioneiros, algumas vezes vinha carne... de rato! Cristin chegou a ficar na fila para a câmara de gás. Relata que nesse momento, levou uma bofetada de um soldado, caiu no chão e foi chutada por ele, que a prendeu em uma cela. Desta forma inusitada, foi salva da morte. Credita sua sobrevivência ao seu “padrinho”, Deus. Só através dele “o bem vence o mal”, afirmou.

Cristin traça um paralelo da situação pós-guerra Alemã e o Brasil, cuja situação revela alto índice de desemprego e falta de dinheiro, mesmo tendo um povo trabalhador. É para evitar a disseminação de ideais semelhantes aos propagados pela ideologia nazista, que ela torna pública sua história, através de palestras e de seus livros, mesmo que isto traga à sua memória recordações terríveis. Mas também chega a uma conclusão: “Nazismo é um câncer que se espalhou pelo mundo. Não tem cura!”.

A motivação inicial de Goldberg e do grupo que se reunia à noite em uma marcenaria era a liberdade e a democracia. Para isso, tiveram que aprender a lutar. Por outro lado, o regime criava o ideal da Juventude Nazista através, por exemplo, da Napola, um conjunto de escolas para estudantes entre 10 e 18 anos. Em 1941 havia 32 escolas, onde 6.000 estudantes eram educados como Nacionais Socialistas (Nazis), eficientes em “corpo e mente”, para servirem o povo e o Estado. Goldberg conta que “as crianças marchavam pela manhã e à noite e ganhavam boa alimentação”. Dessa forma, passavam até a desobedecer aos pais, chegando até a traí-los, denunciando quando não eram a favor do nazismo.

A sobrevivente lembra da importância de um simples canivete. Além de protegê-la em algumas situações, chegou a fazer, com ele, uma cesária e a tirar balas do corpo de pessoas. E afirma: “Os maiores heróis foram as mulheres”. Para exemplificar, conta que mães judias cantavam enquanto estavam na fila da câmara de gás, com seus filhos no colo.

Ao trazer as marcas de um período trágico, Cristin Goldberg desperta nos jovens o sentimento da necessidade de “se fazer algo” contra movimentos como os neo-nazistas. É impossível manter-se passivo após ver e ouvir o que esse tipo de ideologia fez a seres humanos, independentemente de sua raça, cor ou opção sexual. Cabe ao jovem e também aos formadores de opinião, como professores e jornalistas criar um fórum de discussão para que a apatia seja colocada de lado, e até mesmo uma certa postura individualista e egoísta, e o passado seja revisto e analisado, para que erros não voltem a ser cometidos.


A INTOLERÂNCIA SOBE AO PODER
Colaboração: Prof. José de Almeida Amaral Jr.

Ao fim da 1ª Guerra Mundial, o Tratado de Versalhes impôs severas e humilhantes punições à Alemanha. O país teve perda territorial e seu exército foi desarmado e reduzido. Além do mais, foi proibida de fabricar armamentos e foi obrigada a efetuar pagamento de pesadas indenizações de guerra à Grã-Bretanha e à França. Provavelmente reside aí o nascimento de um nacionalismo radical no curto período que antecedeu a 2ª Guerra.

Para entender este período pré-guerra, é preciso conhecer a história do Partido do Trabalhador Alemão na Baviera, fundado em 5 de janeiro de 1919. Hitler se associou ao partido em setembro seguinte, e tornou-se seu principal orador. No ano seguinte o grupo adotou o nome Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP) e definiu seu programa político, marcado pelo anti-semitismo, extremo nacionalismo e críticas ao capitalismo internacional. Em um período de 3 anos o partido cresceu de forma significativa.

Em 1923, após uma tentativa frustrada para depor o governo republicano da Bavária através de um golpe, Hitler foi preso. No período de nove meses em que esteve na prisão escreveu Mein Kampf (Minha Luta), que resume a ideologia do Nazismo, creditando a situação da Alemanha à diversidade racial do Império Austro-Húngaro, a mistura de raças, a corrupção da democracia e do liberalismo e a ação política de judeus e comunistas. Para inverter a situação do país, Hitler defende o isolamento racial (crença em uma suposta “raça ariana” superior), a centralização do poder, um estado militarista e intervencionista na economia, e a intolerância com a diversidade ideológica. O livro traz ainda lições sobre o comportamento psicológico das massas e como conquistá-las.

Embora fosse até ridicularizado no início, o partido (e o discurso nazista) cresceu devido ao aumento do empobrecimento da população. Candidato à presidência, Hitler não conseguiu eleger-se em 1932, mas o vencedor, Paul von Hindenburg, o nomeou chanceler no ano seguinte (com o apoio de mais de 1,5 milhão de adeptos). Hitler, então, dissolveu o Reichstag, a câmara baixa do parlamento alemão, e convocou novas eleições. Em 27 de fevereiro de 1933, após um incêndio no prédio do Reichstag, Hitler acusa os comunistas e adquire poderes ditatoriais em março, com o apoio popular. Acompanhado de outros nazistas como Goering, Himmler e Goebbels, passa a perseguir toda a oposição, além de minorias étnicas e religiosas.

Em 1934, o parlamento alemão vota a favor da concentração das funções de presidente e de chanceler. As forças armadas passaram a prestar-lhe juramento como Führer (líder ou guia). Nascia o III Reich. Hitler conseguiu dinamizar novamente a economia. Seu regime impôs uma combinação extremada de capitalismo e socialismo estatal, em que tanto os proprietários de grandes empresas como os operários se subordinavam ao controle do Estado e ao poder público totalitário. São criadas as Leis de Nuremberg, para discriminar os judeus, tornando o anti-semitismo política oficial da Alemanha. Além dos violentos grupos paramilitares, Hitler apoiava-se em uma eficiente máquina de propaganda. A partir de 1936, surgem leis contra negros, judeus, homossexuais e ciganos. Professores judeus são expulsos das universidades e pouco a pouco os alunos também. Os alemães são proibidos de comprar em lojas de judeus e judeus são proibidos de entrar nas lojas alemãs, restaurantes, cinemas, teatros, museus e exposições. É promulgada uma lei que obriga o uso da estrela amarela (Estrela de Davi) costurada nas roupas ou em tarjas nos braços, para diferenciar os judeus. A humilhação contra os judeus é intensificada.

Desde 1934, judeus que conseguiam emigrar deixavam para trás bens, amigos e pátria. Mas outros permaneciam, ou acreditando que o nazismo seria derrotado, ou por não terem dinheiro para comprar a passagem, tirar passaporte e visto. Por outro lado, alemães, em sua maior parte intelectuais, não concordam com a situação, chegando a apoiar judeus e minorias perseguidas. Mas isso não impede que milhões de pessoas sejam confinadas em campos de concentração e muitos deles sejam mortos - o que veio a ser conhecido como Holocausto.

No que se refere à política externa, em 1938 a Áustria é anexada. Não prevendo o que ainda estava por vir, Grã-Bretanha e a França assinam o Pacto de Munich, cedendo a região dos Sudetos, então território da Tchecoslováquia, para a Alemanha. O Primeiro Ministro da Grã-Bretanha, Neville Chamberlain chega a afirmar, em Londres, que com isso teria conseguido a paz. Enquanto isso, Hitler alia-se com o italiano Benito Mussolini e com o espanhol Francisco Franco, a quem ajudou na Guerra Civil Espanhola. A Áustria foi absorvida pelo "III Reich" e a Tchecoslováquia foi desmembrada. O governo comunista de Josef Stálin, da URSS, assinou com Hitler, em 1º de setembro de 1939, um pacto de não agressão, o que permitiu a invasão da Polônia.

A Alemanha forma com a Itália e Japão uma coalizão (o Eixo). Inglaterra, França e Rússia constituem-se os Aliados, posteriormente com a participação dos EUA e de outras nações, inclusive o Brasil, sob o governo do Estado Novo de Getúlio Vargas. Depois de algumas vitórias iniciais, a Alemanha vai sendo sufocada pelos Aliadose, que em 1944 ficam em franca vantagem. Mesmo perdendo, Hitler continua a lutar, o que leva alguns militares nazistas a tentar assassiná-lo. Em 30 de abril de 1945, Adolf Hitler suicida-se num bunker (uma fortaleza) em Berlin, junto com sua mulher Eva Braun.

Com a capitulação das tropas alemãs, em 8 de maio de 1945, terminou na Europa a Segunda Guerra Mundial. Nos dias 6 e 8 de agosto foram lançadas duas bombas atômicas, respectivamente sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki. O término oficial do conflito deu-se, então, em 15 de agosto daquele ano, quando o Imperador Hiroito anunciou a capitulação do Japão.

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