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Lamaçal

Ás vezes sinto que, ao invés de estarmos no globo terrestre, estamos caminhando sobre uma verdadeira e enorme areia movediça. As notícias revelam “laranjas” daqui, “jeitinhos” dali e as instituições nacionais acabam por espelhar aquilo que a sociedade ainda não conseguiu eliminar ou, pelo menos, diminuir: a corrupção.

Eu posso afirmar que nunca sai por aí com dólares na mala ou escondido em meus trajes íntimos. E, provavelmente, você também não. Mas e se a acusação for outra? Por exemplo:

- "Molhar" a mão do policial ou fiscal para não levar uma multa (seja no carro, seja no comércio);

- Deixar de cobrar uma nota fiscal para obter um maior desconto;

- Arranjar uns recibos médicos para "incrementar" o Imposto de Renda;

- Comprar softwares, CDs de música e DVDs de filmes, todos piratas (afinal o original é muito caro...);

- Colocar uma fita adesiva na placa do carro para escapar do rodízio (isso para o pessoal da capital paulista);

- Se for convidado, topar virar assessor parlamentar (sem trabalhar), "devolvendo" parte (a maior, é claro) de seu salário para o político que o contratou;

- “Esquecer” de devolver o troco dado a maior.

Melhor parar por aqui. Assim como a Economia tem sua visão “micro” e “macro”, acredito que a corrupção também. O ser humano é ganancioso. E sua ganância varia de acordo com a oportunidade que estiver à sua frente. Mas, desde o troco da padaria recebido a mais e não devolvido, até a “gratificação” nas licitações para beneficiar alguém específico, a palavra central esquecida é: Ética.

Com certeza não há falta de denúncias através da mídia. O problema é que, assim como a violência e o terror são cada vez mais banalizados, pois assistimos a tudo confortavelmente da nossa poltrona, em nossas televisões, tomando um gole de refrigerante, como se estivéssemos assistindo a um filme, também aprendemos a assistir às CPI's “via Embratel”, como se fosse mais uma das muitas novelas ou até mesmo um reality show. “Será que alguém vai se estapear? Alguém será xingado?”.

Nós, cidadãos, precisamos eliminar a distância entre aqueles que nos representam (ou deveriam fazê-lo). Devemos encarar nossos nobres legisladores, cobrar uma postura ética, visando o bem público e não o bem particular.

Culpamos o Poder Executivo pelas penumbras do país (e este possui, sim, uma grande parcela de culpa), mas esquecemos que o grande parte do poder está no Legislativo, nas mãos de deputados e senadores que não representam o povo brasileiro e que, quando suas maracutaias são descobertas, conseguem amarrar as apurações internas e até mesmo o Judiciário, com as mais vis artimanhas para saírem ilesos.

O silêncio imposto pela ditadura não pode dar origem ao silêncio do descaso, da falta de ação, do medo de protestar. A democracia já está amadurecida. Como afirma a canção de Beto Guedes: "A lição sabemos de cor, só nos resta aprender".

(Publicado em outubro/2007 na Revista Ave Maria)

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