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Kid Vinil

“As rádios só querem ganhar dinheiro”
Reportagem: Fábio Davidson (março/2003)

kid vinil
(por Zeca Baleiro, in: Por onde andará Stephen Fry?)

kid vinil quando é que tu vai gravar cd
kid vinil quando é que tu vai gravar cd

tecnologia existe pra salvar o homem do fim
se você estiver triste delete a tristeza assim
e se quiser conversar passe um fax pra mim
time is money god is dead have you a nice dream

acessando a internet você chega ao coração
da humanidade inteira sem tirar os pés do chão
reza o pai-nosso em hebraico filosofa em alemão
descobre porque que o Michael deu chilique na televisão

milhares de megabytes
abatendo a solidão
com a graça de bill gates
salve a globalização
se homem já foi a lua
vai pegar o sol com a mão
basta comprar um pc
aprender o abc da informatização


Ele é paulista, palmeirense, morou no Bixiga durante 20 anos e é um grande colecionador de discos. Também é jornalista, radialista, tendo participado do início da 89 FM, ao lado do produtor Gilles Phillippe (falecido em 1998) e da locutora Selma Boiron, que trabalhou na “Maldita” Fluminense FM. Na TV Cultura apresentou o programa Boca Livre, de 1987 a 1989 e depois passou a apresentar o programa Som Pop, que durou até 1993. Em seguida apresentou o Lado B, na MTV. Agora está na rádio Brasil 2000 FM onde recentemente tornou-se diretor artístico, além de apresentar os programas “Última Hora” e “Dicas do Vinil”, com informativos musicais durante a programação diária da rádio. Na música foi um dos precursores do punk no Brasil. Em 1980 montou a banda Verminose, composta por Minho K (guitarra), Trinkão (bateria), Stopa (baixo), onde fazia o vocal. Mais tarde, com a saída de Minho K, entrou no lugar Ted Gaz e a banda passou a se chamar Magazine, mudando o som de rockabilly para new wave. Com um estilo sempre bem humorado, o Magazine estourou com alguns sucessos nos início dos anos 80, como "Sou Boy" e "Tic-Tic Nervoso". Em 1985, formou outra banda,
dessa vez de blues-rock, chamada Os Heróis do Brasil, com a qual lançou um disco em 86.
Em 1988 o Verminose voltou com outra formação e cinco anos depois lançou o álbum "Xu-Pa-Ki".
Em 1997, o compositor maranhense Zeca Baleiro gravou um divertido tributo a este ícone em seu disco de estréia “Por Onde Andará Stephen Fry?” e recebeu o “troco” no recente CD do Magazine, “Na Honestidade”,
lançado pela gravadora Trama, onde também trabalhou, como diretor artístico internacional.
Estamos falando de Antonio Carlos Xenofonte, ou melhor, Kid Vinil.

Em primeiro lugar, como surgiu o nome Kid Vinil?
Foi devido a um programa de rádio em 1979. Era um programa de funk e new wave, era o primeiro programa brasileiro com estes estilos de músicas. Na verdade, eu precisa de um pseudônimo, Antonio Carlos não ia rolar mesmo, então procurei um nome de impacto, um nome que fosse divertido ao mesmo tempo. E aí um amigo tinha voltado de Londres, por onde eu já tinha passado algum tempo na época do início do punk, começando com Sex Pistols, Clash, tal. Tinha uns DJ´s com nomes engraçados. Tinha um que chamava Cosmo Vinil que trabalhava com o Clash e um da BBC que era Kid Jensen. Quando eu fiz o primeiro piloto pra rádio – era um programa de punk – tive a idéia de colocar Cosmo Vinil. Mas aí falei, vou usar o mesmo nome do DJ do Clash? Vai ficar meio estranho. Aí, pensamos, vamos colocar Kid Vinil, pegar um pouco de um e de outro. Kid Vinil soa bem em português e Vinil tem a ver com disco.

Tudo isso em qual rádio?
Rádio Excelsior. É uma rádio que não existe mais, foi comprada pela Globo [hoje, CBN].

Em que ano?
Foi no final de 79.

Como era o programa?
Era punk e new wave. Estava começando a entrar no Brasil. Basicamente eu tocava só isso, porque eu tinha acabado de voltar da Europa.

E o público brasileiro? Como recebeu o punk?
Era um primeiro contato. Tudo era novidade. Aí fui conhecendo o Clemente do Inocentes, uma turma que começou o punk no Brasil, o Carlos do Cólera, o Fábio do Olho Seco. Aí a gente acabou formando até uma turma. A gente fazia uns sons pro lado de Santana, mais periferia mesmo. E as coisas começaram a rolar. Aí surgiu a primeira leva do punk, que era punk rock, no começo dos anos 80.

Os discos vinham todos na bagagem?
Exatamente, todo mundo que viajava, trazia seus discos prá tocar. Porque era complicado conseguir os discos.

Por aqui não tinha nenhum trabalho a venda?
Não, nenhuma gravadora produzia aqui. Tinha pouca coisa, tirando Sex Pistols, que saiu aqui e o primeiro do Clash, mas era pouca coisa.

Você trabalhava só na rádio nesta época?
Na verdade eu também trabalhava em gravadora. Eu trabalhava na Continental, com produção e direito autoral. Eu me especializei na área de Direito Autoral.

Direito autoral é um tema que está em alta no momento...
É... Eu trabalhava direto com a editora, que editava as músicas dos autores, arrecadava junto ao ECAD, brigava. Eu trabalhei com uma pessoa, o Vítor Martins, que sempre foi um cara que brigou muito com o ECAD. Ele era parceiro do Ivan [Lins], é parceiro até hoje e é um cara batalhador nessa área do direito autoral.

O ECAD [Escritório Central de Arrecadação e Distribuição] acaba sendo uma fachada?
É muito complicado. Não é uma coisa tão honesta como deveria ser... Como é lá fora.

Da mesma forma que a Ordem dos Músicos do Brasil?
É. Eles também roubam descaradamente.

Então o músico está bem desprotegido no Brasil?
Totalmente. Se depender de alguma entidade, ele não tem.

No mercado externo o músico tem mais proteção?
Com certeza. Tem a sociedade do EMI, a ASCAP [American Society of Composers, Authors and Publishers], por exemplo, americanas, que defendem o direito do autor, que sempre lutaram de uma forma honesta, trabalhando mais pelos músicos.

Mudando um pouco de assunto, é impossível deixar de falar no Magazine, banda que está voltando a parada. Como foi o início da banda, como vocês se conheceram?
A gente se conheceu trabalhando na Continental. Eu conheci o baterista lá, o guitarrista também trabalhava lá e a gente formou uma banda lá dentro mesmo.

Era uma banda de garagem?
Era uma diversão, a gente ensaiva no Bixiga, na casa do baterista. Isso foi em 1979, a mesma época em que eu comecei a fazer rádio. E foi uma brincadeira, a gente nunca esperava que ia chegar a se profissionalizar a fazer alguma coisa tão seriamente, a gravar um disco. Tá certo que a gente estava dentro de uma gravadora... E na época os grupos de rock estavam em baixa. Depois que veio a geração 80 que começaram a dar uma força. No final da década de 70 era época dos cantores e cantoras de MPB, então não existia ainda o rock como surgiu na década de 80, quando apareceram mais grupos e aí a gente teve oportunidade. De uma brincadeira acabou se tornando uma coisa mais séria.

A gravadora acabou dando alguma perspectiva?
Ah, sim, a gente acabou tendo uma oportunidade legal dentro da gravadora.

Como era a divulgação do trabalho na época? Muito jabá [execução de música mediante pagamento]? Naquela época era até mais fácil, por que hoje em dia só se fala em “jabá”, em tanta coisa e, claro, tinha jabá também.Não vou dizer que não tinha, porque para ir televisão, por exemplo no “Chacrinha” , a gravadora pagava. Prá ir nesses programas todos de TV a gravadora tinha de pagar, mas talvez não fosse tão excessivo quanto é hoje, talvez a máfia não fosse tão grande quanto é hoje. Dá impressão que, de certa forma, as rádios não eram tão mafiosas, nem os programas de TV.

Como foi sua passagem pela 89 FM, em São Paulo?
Eu comecei lá em 86.

A proposta era tocar rock alternativo?
Até era uma rádio alternativa, tipo college radio, embora não tivesse vínculo com nenhuma universidade. Mas a gente fazia uma rádio que tocava muitas coisas do rock alternativo. Era uma rádio livre, mas aos poucos ela foi entrando no sistema, mudando, mudando e se tornando cada vez mais pop, cada vez mais comercial.

O início foi com o Gilles Phillippe e o Fábio Massari?
É. Na verdade quem estava no começo era o Anderson, eu... de conhecido ali não tinha muita gente... o Luis Augusto, que passou a coordenador. O Massari assumiu a rádio muito tempo depois, nos anos 90.

Qual sua opinião sobre as mudanças de estilo em rádios como 89FM e 97FM?
As rádios querem ganhar dinheiro, mudar, se tornar uma empresa financeiramente rentável. Isso acontece muito com as rádios, se aplica a todas elas. Eu não sou partidário disso. Acredito que deveria haver uma rádio que não se preocupasse tanto com isso. A Brasil [2000 FM] é uma das primeiras que não se preocupa tanto com isso.

E a Kiss FM, você ouve?
A Kiss é uma rádio que não tem tanto esta preocupação. Eu acho a Eldorado [FM] uma rádio que também não tem nenhum compromisso, não é uma rádio rock, mas não tem compromisso com jabá, com IBOPE.

Você sente saudades de programas como o Boca Livre e o Som Pop?
Eu achei legal fazer o Boca Livre pra [TV] Cultura. Tá certo que o formato ainda não era o exato, só no final que a gente chegou a um formato legal, de bandas ao vivo. No início era um programa de escolas, mas era interessante pelo espaço. Depois, o Som Pop eu peguei em uma última fase dele, fizemos vários especiais, uma série chamada História do Rock, que foi legal fazer. Justamente o Som Pop acabou por causa da MTV. Na época a Cultura achou que, com a MTV, não haveria necessidade de programas de vídeo-clipe e na época começou a surgir a exclusividade de alguns vídeos, ficou difícil para a Cultura conseguir material novo, então por isso eles resolveram acabar com o programa. Eu achei chato acabar, mas eles não tinham outra alternativa na época.

E qual sua opinião sobre a MTV no cenário musical, antes e hoje?
Eu gostava mais dela antes. Hoje acho que ela virou mais uma emissora de programas, não tem muito a ver com a Music Television, que era a proposta inicial. Eles comercializaram muito mais a proposta, os programas estão muito mais populares e a emissora se tornou mais popular. De certa forma eles conseguiram mais IBOPE. É engraçado, porque quando eu estava fazendo o Lado B, às vezes eu ia ao supermercado e a caixa do supermercado sabia que eu trabalhei na MTV ou pessoas mais do “povão” que assistiam a MTV. Era diferente da época que a MTV tocava um tipo de música mais segmentada. E agora ela atingiu um público maior, com certeza. Se esse era o objetivo, ela chegou a ele, mas, de certa forma, ela teve de mudar muito, saiu da proposta inicial. Tanto que alguns programas acabaram, até o próprio Lado B não existe mais.

Qual sua opinião sobre a onda de “acústicos”? O Magazine se encaixaria em um acústico?
Eu acho difícil... É engraçado, divertido até. Mas não é necessariamente aquilo que a gente faria. Alguns até ficam bem fazendo acústico, algumas coisas ficam interessantes. Mas nem tudo foi feito para ser acústico, depende muito da maneira como a pessoa arranja seu trabalho para o acústico. Tem alguns acústicos que eu gosto, tanto internacionais como nacionais.

Você fez um trabalho com os Heróis do Brasil, com o André Cristovam. Você tem planos de fazer algum trabalho solo, há alguma coisa que você ainda não fez, mas gostaria de fazer?
Carreira solo não. Eu gosto de trabalhar com banda. Então se for fazer alguma coisa vou fazer com banda, com essa ou com outra. Carreira solo eu tentei algumas coisas, mas não achei muito legal. É muito mais interessante trabalhar em banda.

Como tem sido seu trabalho na Brasil 2000 FM?
Eu sempre gostei de trabalhar em rádio. Enquanto tiver espaço vou continuar fazendo. Não é tão fácil assim, hoje as rádios estão muito mais comerciais, mais voltadas para uma fórmula mais popular e cada vez mais os espaços ficam restritos. Mas de certa forma a Brasil é uma casa em que já trabalhei várias vezes e sempre fiz um trabalho legal, sempre volto, é um espaço que eu tenho conseguido e espero conseguir sempre.

Qual sua dica para as bandas que querem produzir um som alternativo?
Eu acho que a cena alternativa hoje está mais fácil, tem selos, tem gravadoras, muita gente batalhando seu próprio trabalho. Eu acho que é isso mesmo. O lema do Punk era “Faça você mesmo”. Não tem que esperar que uma gravadora vá te contratar, que você vá acontecer. Procure suas próprias possibilidades, saia por aí, monte seu site, procure divulgar sua música de alguma maneira. Eu sei que não é fácil, os caminhos são difíceis, mas procure abrir seus próprios caminhos. É o que muitas bandas fazem e conseguem. Também é necessária uma certa originalidade e um bom senso para fazer músicas.

Discografia
NA HONESTIDADE (2002)
TRAIDÔ - 20 BANDAS TOCANDO RATOS DE PORÃO (Ratos de Porão)
KID VINIL (1989)
KID VINIL & OS HERÓIS DO BRASIL (1986)
MAGAZINE (1983)

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