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Heródoto Barbeiro

Esta foi minha primeira entrevista "oficial" ( Fábio Davidson - março/2003)

Ele é bacharel em jornalismo e direito e pós-graduado em história. Já foi professor e trabalhou na rádio Jovem Pan e nas TVs Gazeta e SBT. Atualmente está na televisão, apresentando o Jornal da Cultura e no rádio, onde apresenta pela manhã o Jornal da CBN (Central Brasileira de Notícias). É colunista em periódicos, revistas e na internet, além da dar cursos e palestras.

Seu nome é uma feliz coincidência com o “pai da História”, o grego Heródoto?
De uma certa forma é uma coincidência. Mas todos meus irmãos têm nomes gregos. Meu pai era um homem que gostava muito de História e de literatura clássica, então não sou o único que tem nome grego na minha casa. E, por coincidência, o meu nome está ligado à História e eu fiz História. Mas eu tenho irmãos que têm nomes ligados a outras ciências e acabaram não se ligando a elas como eu me liguei à História.

E assim como o historiador grego, você também gosta de viajar e de contar histórias?
Sim, eu gosto muito de viajar, gosto de contar histórias e tenho procurado contar histórias das experiências que tenho vivido por aí. Acho que o fato de você viajar e conhecer outras culturas é uma forma de crescer bastante e poder entender um pouco melhor a humanidade.

Sente saudades da época de professor?
Para ser sincero não sinto saudades, porque o meu volume de trabalho atualmente como jornalista é de tal ordem que não dá tempo para isso. Dar um curso é um compromisso de um semestre ou de um ano todo. Então tem planejamento, tem muito estudo, tem preparação de aula toda semana, tem que corrigir os trabalhos. No momento, não tenho saudades disso. Talvez, no futuro, quando eu parar de ser jornalista, possa voltar a dar aulas.

O que o atraiu mais no Jornalismo?
O fato de você, em primeiro lugar, ter oportunidade de contar para uma parte da sociedade o que a outra parte da sociedade está fazendo. É uma coisa apaixonante. Segundo, o fato de que não há rotina como há na aula. Por mais que você estude, as aulas são rotineiras. No jornalismo não há rotina. Eu vou dormir à noite achando que sei tudo que aconteceu, levanto no outro dia e vejo que já aconteceu uma porção de coisas que eu não sabia. Então é a quebra da rotina, é a mudança e é principalmente a dinâmica dessa profissão.

Ao cursar jornalismo, como foi voltar a ser aluno, mesmo já sendo mestre?
Foi uma experiência extraordinária e foi também um banho de humildade. Quando você é professor durante muitos anos começa a adquirir determinados vícios e determinadas posições, porque você sempre fala de um conhecimento profundo do que você sabe. Aí, de repente, você vira aluno, quer dizer, você passa para o outro lado do balcão e percebe que não é bem assim. Então para mim foi uma experiência, que eu creio ter sido extremamente compensadora, não só profissionalmente, mas uma experiência pessoal importante para o meu aprendizado.

Existe muita arrogância no meio jornalístico?
A arrogância ela não é privilégio de determinadas situações. A arrogância é um daqueles pecados que os jornalistas têm que combater diariamente. Porque muitas vezes você acha que é muito importante, porque fala com A, com B ou com C, mas na verdade a maior parte das pessoas estão atendendo ao veículo em que você trabalha e não a você pessoalmente. Então é necessário você construir gradativamente, com muita humildade a sua importância pessoal e saber que você está a serviço não da sua causa, você está a serviço da causa dos seus telespectadores, dos seus ouvintes, do seu leitor.

Você considera que o ensino de Jornalismo melhorou, piorou ou continua da mesma forma do que na época em que você estudou?
O ensino exatamente, eu não posso fazer avaliações porque eu não tenho ido às escolas... Mas eu percebo que tem havido um descompasso muito grande entre o que eu vejo no dia a dia, no cotidiano e as pessoas que saem da faculdade. Então a impressão que eu tenho é que os currículos das universidades são distanciados da realidade, do dia a dia, do cotidiano. Isto eu estou falando pela quantidade de estagiários que eu conheço e convivo todos os dias. Então eu acho que os currículos precisariam ser melhor pensados.

Com relação ao estágio, há uma certa ilegalidade na contratação de estagiários na área de jornalismo. Isso é bom para o aluno? É bom para as empresas? É bom para o aluno, indiscutivelmente e é bom para a empresa também. Na questão do estágio, há quase o que a se poderia chamar de uma desobediência civil. Porque o estágio é proibido, no entanto ele existe em todas as empresas. O estágio não tem que transformar o estudante em mão de obra escrava, nem deve ser uma forma de você pagar salários menores, porque isso é burrice, obviamente. Jovens jornalistas têm que conviver com velhos jornalistas para que as experiências possam ser trocadas. Quando você bota jovens com velhos, não são só os velhos que ensinam para os jovens. Os jovens ensinam para os velhos a nova visão do mundo. E para você ter uma nova visão do mundo você não precisa nem ir para a faculdade, basta ser jovem. Então eu acho que essa é a correlação que vai ser importante nas redações.

Cursar a faculdade é realmente essencial para formar um bom jornalista?
Eu acho que não é necessário para formar o jornalista. O jornalista pode se formar com a faculdade, mas pode até se formar fora dela também. Mas a faculdade é uma forma dele se aprimorar enquanto jornalista. A faculdade tem que ser o grande fórum de discussão do jornalismo, da ética dos jornalistas, dos limites do jornalismo. E associada à prática cotidiana do fazer jornalismo.

O que ajuda o estudante para ele se tornar um bom jornalista?
Primeiro eu acho que ele tem que estar apaixonado pela profissão. Segundo, ele tem que sentir nos seus professores aquelas pessoas que vão ajudá-lo a realizar o seu sonho que é ser um bom jornalista, certo?

Você é a favor da Lei da Imprensa?
Não. Eu sou a favor de que todos os crimes cometidos pelos jornalistas sejam capitulados ou pelo Código Civil ou pelo Código Penal. Não acho que deva haver uma lei especial para crimes praticados por jornalistas.

A formação de um Conselho Federal de Jornalismo facilitaria isso?
Eu acho que deveria existir nacionalmente ou regionalmente ou até na própria cidade, Comissões de Ética Jornalística. Poderia ser uma ONG, formada por exemplo pelos editores jornalísticos que analisassem, discutissem e publicassem questões éticas do jornalismo. Como forma das pessoas se defenderem de reportagens que não estão corretas.

Você tem alguma preferência por rádio ou televisão?
Não, não tenho. Eu tenho preferência pelo veículo que facilite a minha comunicação num determinado momento. Há determinados momentos que é rádio, há determinados momentos que é TV, porque eu tenho a imagem. Há determinados momentos que são artigos que eu escrevo no jornal. Eu acho que, na verdade, o que importa não é o veículo, o que importa é a mensagem.

Como era trabalhar em programas como Vox Populi e Roda Viva?
São programas extremamente interessantes, que exigem um aprimoramento da gente muito grande, uma atenção muito grande e faz com que você cresça culturalmente porque os entrevistados são pessoas que têm coisas importantes a dizer. Vocês podem prestar atenção que são verdadeiras aulas.

Qual o principal motivo do rádio não sucumbir à televisão?
O rádio não sucumbe à televisão porque as pessoas precisam do rádio. As pessoas precisam muitas vezes trabalhar e se informar simultaneamente. Dirigir e se informar ou se distrair. E o veículo que se adequa a isso é o rádio.

Como foi levar o jornalismo do AM para o FM?
Essa proposta de quebra de paradigmas, de tirar do AM e passar para o FM, eu apresentei aqui na empresa há seis anos atrás e por muito tempo a empresa não queria aceitar esta proposta. Depois eles toparam e isso deu uma alavancada imensa na propagação do jornalismo da CBN. Isso fez uma rádio melhor qualificada e mais jovem. Porque até então se dizia que jovem não ouvia notícia. Não é verdade. Jovem não ouvia o AM. A hora em que a notícia passou para o FM, ele passou a ouvir.

Qual a visão principal de jornalismo da rádio CBN?
É a busca diária da isenção jornalística e se pautar pelos princípios éticos da profissão. Isso é o que nos move diariamente.

Como que a CBN consegue um feedback da audiência?
Exclusivamente pela Internet, através dos e-mails que são mandados para cá. São dezenas... dezenas não, eu digo para você que aqui deve chegar quase dois mil e-mails por dia. E através da aferição da audiência feita pelo IBOPE.

Como é apresentar um programa ao vivo? Você considera-se um âncora?
Eu me considero um indivíduo que pega a notícia e entrega para o ouvinte ou entrega para o telespectador. A palavra âncora, no Brasil tomou uma distorção muito grande. Eu me considero apenas um jornalista.

Você considera que entrevistar é uma arte?
Eu considero entrevistar um treino. A gente aprende a entrevistar. É treinando que a gente aprende a entrevistar.

Quais seriam os princípios básicos para uma boa entrevista?
Primeiro: conhecer o assunto. Tem muita gente que entrevista sobre um assunto que não conhece; segundo: fazer boas perguntas; e terceiro: deixar o entrevistado falar.

Tem alguém que você gostaria de entrevistar e ainda não foi possível?
Bem, não sei, não sei. Os que eu não consegui até agora foi porque não quiseram, ficaram fugindo... Eu respeito a decisão deles, mas eu tenho corrido atrás deles ainda assim... Por exemplo, eu li outro dia no jornal que o Saddam Hussein fala espanhol e de lá para cá nós estamos tentando uma entrevista com o Saddam Hussein. Quer dizer, a gente não vai conseguir nunca, não importa, mas vamos tentar...

Como era trabalhar com Miguel Dias? O que ele representou para a história do rádio no Brasil, do jornalismo no Brasil?
Trabalhar com o Miguel Dias era uma satisfação diária, primeiro porque o Miguel era um jornalista bem informado; segundo, experiente; e em terceiro, muito bem humorado. Eu acho que uma parte do humor que eu tenho hoje no rádio eu devo... eu aprendi com o Miguel a ser mais bem humorado do que eu era. O bom humor é uma forma de você estabelecer uma relação com os seus ouvintes ou telespectadores. Por exemplo, eu estou introduzindo na TV Cultura, à noite, o mesmo humor que eu tenho de manhã no Jornal da CBN. Eu vejo que está criando um certo constrangimento, mas aos poucos as pessoas vão aceitando. Demonstrando também que o fato de você ser bem humorado, não tira sua credibilidade. Esta foi a contribuição que eu aprendi com o Miguel e acho que o Miguel é uma pessoa que representou uma parte do rádio brasileiro importante, tanto no radiojornalismo, da qual ele participou, quanto no rádio entretenimento, uma vez que o Miguel também foi comunicador na rádio Globo.

Você acredita que há uma preocupação maior com a estética do que com a competência dos jornalistas, quando pensamos em televisão?
A estética ainda pesa muito na televisão brasileira. O jornalista bonito ou a jornalista bonita tem muito mais chance na televisão do que o jornalista feio ou a jornalista feia, infelizmente. Mas, obviamente essa é uma questão que eu considero até de um certo retrocesso cultural, porque se você ligar em qualquer dessas televisões internacionais, você vê gente feia e gente bonita, mas todos competentes.

E é difícil quebrar esses paradigmas?
É difícil porque uma parte da TV é a parte da audiência e às vezes você consegue mais audiência, infelizmente e por questões culturais, mais com a plástica do que com o conteúdo. Então se são... sei lá, se você pega um apresentador galã... não importa muito o que ele diz, importa que ele é galã!

Quem você merece destaca no jornalismo televisivo?
O meu destaque na televisão é para dois jornalistas. Um deles é o Boris Casoy e o outro é o Paulo Henrique Amorim. O Boris, pela qualidade do jornal que ele apresenta, que é muito bom e o Paulo Henrique, também pela qualidade do telejornal que ele apresenta, em que pese um fazer comentários e outro não fazer comentários explícitos.

Como é trabalhar em equipe?
Não dá para fazer jornalismo sozinho. Jornalismo é sempre feito em equipe. No Brasil ainda tem aquela história, como você personaliza as coisas. Em vez de falar PT, você fala o partido do Lula, em vez de falar PMDB você fala o partido do Quércia. Então há uma personalização também na TV. Mas não há possibilidade de se fazer jornalismo a não ser em equipe. Ninguém faz jornalismo sozinho.

Em que a Internet ajudou o jornalista?
Ela é uma ferramenta extraordinária, porque através da Internet você tem as fontes que você não tinha antes, você tem essa comunicação direta com o ouvinte, que é muito importante e você também, na Internet, consegue atingir a locais, com o full da rádio que você não atinge com a antena. Então hoje de manhã, por exemplo, eu recebi um e-mail de um cidadão que estava ouvindo o jornal na Alemanha. Coisa inimaginável se eu pensar só na antena.

Como você encara o jornalismo on line?
O jornalismo on line é importante, porém é um jornalismo que tem que ser feito com o máximo cuidado, para que notícias sem fundamento, inexatas, não sejam divulgadas.

A rádio é ainda mais rápida do que a Internet?
Eu acho que isso é absolutamente irrelevante, se é mais rápido. O relevante é ser correto.

O jornalismo brasileiro ainda acompanha o molde do jornalismo estrangeiro?
Eu acho que está muito mais próximo do jornalismo americano do que do jornalismo europeu. Eu não acho que isso seja ruim não, o modelo é bom. O que nós temos que fazer agora é nacionalizá-lo e dimensioná-lo.

No início do governo Lula cogitou-se que os jornalistas estariam dando uma “trégua” ao novo governo. Isso é real? Não, isso não é real não! Eu acho que os jornalistas não deram nem trégua, o novo governo tá aí e está levando paulada em todo lugar. Eu acho que não deram trégua não e eu acho que jornalista não tem que dar trégua para ninguém! Nem para nenhum governo. Nem pro governo A ou pro governo B ou pro governo C, nem coisa nenhuma. Jornalista não serve para agradar todos os governos. O jornalista tem compromisso com o público.

Qual a ligação entre jornalismo e cidadania?
O jornalismo é uma das formas de você difundir a cidadania, fazer com que ela cresça e também é uma forma pela qual os cidadãos se utilizam para exercer a sua cidadania por si mesmos.

E entre jornalismo e ética?
Não há jornalismo sem ética. Quando se fala em jornalismo, você pressupõe já a existência da ética dentro do seu bojo. Uma coisa não existe sem a outra.

O que o estudante de jornalismo e futuro jornalista nunca deve fazer?
Nunca deve mentir, nunca deve se deixar levar pela facilidade, nem acreditar na primeira coisa que ele encontra.

Qual a grande missão do jornalista?
Informar.

Os jornalistas têm desempenhado satisfatoriamente esta missão?
Na média têm.

Um grande jornalista...
Eu já citei aqui o Boris... Dentre outros tantos jornalistas, o Clóvis Rossi, o Carlos Heitor Cony, o Gilberto Dimenstein... Em suma, tem uma lista enorme de grandes jornalistas. Um deles eu gostaria de citar com especial carinho que é o Alberto Dines.

Um grande entrevistador...
Para mim o melhor entrevistador que eu já vi na minha vida, chama-se Paulo Henrique Amorim.

Qual seria a dica que você daria para aquele que quer começar a estudar Jornalismo?
Para quem vai começar jornalismo... A primeira dica que eu dou é a seguinte: Leia jornal!

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