O governo brasileiro, por exemplo, se orgulha de ter baixado o índice de analfabetos para algo em torno de 5,47% da população com 15 anos ou mais. É uma vitória. Porém, é preciso cuidado com a terminologia. Muitos deixam de ingressar nessa estatística, simplesmente por terem aprendido a assinar o nome.
Por outro lado, o que acho pior é a questão daqueles que são alfabetizados, distinguem letras, formam palavras e frases, porém não conseguem compreender ou interpretar idéias. Estes são os analfabetos funcionais.
Acompanhe os dados do Instituto Paulo Montenegro, que compila os dados do INAF – Indicador de Alfabetismo Funcional - mostrando que o aumento da escolaridade no Brasil ainda não garante resultados positivos em termos de alfabetismo funcional.
A) Escolaridade entre 1ª e 4a sérieOu seja, desde o nível fundamental até o superior, o índice de pessoas que apresentam dificuldades na interpretação de um texto ou uma notícia é muito alto. O que também acontece em relação à escrita. Há muita dificuldade em escrever um texto coerente, quanto mais se observarmos os aspectos gramaticais e ortográficos.
– 30,6 milhões entre 15 e 64 anos.
- Mais de 2/3 (68%) dos que estudam ou estudaram até a 4ª série atingem no máximo o nível rudimentar de alfabetismo, ou seja, são capazes de entender as informações contidas em textos simples como cartas ou anúncios curtos, mas não conseguem compreender textos mais longos.
- Quase 4 milhões (13%) dos brasileiros nesta faixa de escolaridade são avaliados como analfabetos em termos de leitura/escrita, pois não conseguem decodificar palavras ou frases, ainda que em textos simples.
- E 4% deste grupo (mais de 1 milhão de brasileiros) não são capazes de realizar tarefas elementares com números, como ler o preço de um produto ou anotar um número de telefone.
B) Escolaridade entre 5a e 8a série
– 31,1 milhões entre 15 e 64 anos.
- Apenas 24% do total pode ser considerado plenamente alfabetizado em termos de leitura e escrita e apenas 16% quando consideradas as habilidades matemáticas.
- A maior parte deste grupo se enquadra no nível básico de alfabetismo, tanto no quesito letramento (51%), como em numeramento (58%).
- Cerca de ¼ destes indivíduos encontra-se ainda no nível de alfabetismo rudimentar, enfrentando sérias dificuldades em leitura/escrita (24%) e matemática (25%), mesmo cursando ou tendo cursado o ensino fundamental.
C) Escolaridade ensino médio ou superior
– 50 milhões entre 15 e 64 anos.
- Apenas neste grupo prevalecem os indivíduos que têm pleno domínio das habilidades de leitura e escrita (56%).
- Pouco menos da metade (49%) registrou nível pleno de alfabetismo em habilidades matemáticas.
Quando vejo estes dados, lembro que estamos em um país - ou em uma era - onde a televisão e também o rádio são os principais meios de informação. A notícia falada alcança analfabetos e alfabetizados. E a imagem televisiva, muitas vezes nos entorpece, nem precisamos ler mais nada.
Mesmo nesse cenário, se você for na banca de jornais ou em uma revistaria, será capaz de verificar dezenas e dezenas de publicações. Claro que grande parte delas são sobre fofocas, celebridades, sobre os próximos capítulos das novelas, etc.
Mas, há também as revistas ditas jornalísticas. Estas, talvez, cada vez mais têm conseguido atingir um público analfabeto funcional. Por que falo isso? Por exemplo, a revista semanal com uma das maiores tiragens do país não consegue abandonar seu tom editorialista, publicando opiniões no formato de notícias. Não faço um movimento contra a leitura da tal revista. Querendo ou não, ali está um resumo das notícias da semana. Por isso, podemos ler, mas é preciso aguçar o senso crítico para separar o joio (notícia) do trigo (opinião e manipulação).
Constatado o problema, qual seria a solução? Espero que você dê a sua, na parte dos comentários. Do meu lado, acredito que o estímulo à leitura de qualidade é uma dos principais armas contra o analfabetismo funcional e contra a manipulação, tanto do governo, quando das empresas (que se aproveitam de consumidores e empregados).
Nesse ponto, posso responder mais diretamente à pergunta da Georgia - Blog Saia Justa - e da Meiroca, que encabeçaram essa blogagem coletiva no Dia Nacional do Livro. Lá no Saia Justa tem uma lista extensa daqueles que estão participando (recomendo a leitura do post d'A Gruta do Lou). A proposta da blogagem pedia para respondermos a pergunta:
O que você faz para acabar com o analfabetismo no Brasil?
Respondo. Felizmente, hoje, posso dizer que faço algo prático, não fico só na semântica. A igreja em que congrego - Projeto Raízes - esquematizou para este ano o Projeto Criador, que visa dar apoio psicológico, pedagógico e administrativo para crianças entre 9 e 15 anos que moram na região da Pompéia (no entorno da igreja).Alguns trabalhos desenvolvidos: esporte; dança; artesanato; música; teatro; jogos de salão; almoço; aconselhamento; reforço escolar; reunião com familiares; e acompanhamento da saúde das crianças.
Cada atividade tem um coordenador, que trabalha com uma equipe de voluntários. Os maiores atrativos são os esportes e a alimentação (o que já acontecia antigamente, mas não de forma estruturada). Para esse ano, cirou-se uma norma a fim de que o acesso aos esportes e ao almoço têm como pré-requisito a participação das crianças em atividades musicais, dança e da RODA DE LEITURA, onde colaboro como voluntário.
A proposta para a Roda de Leitura
É nítida a dificuldade desta faixa etária na leitura e na interpretação de textos. Por isso estabelecemos os seguintes objetivos:
1. Promover e incentivar o prazer pela leitura e pelos livros;
2. Promover oportunidades de aprendizado direto e imediato (melhora da leitura e compreensão do texto, aumento do vocabulário, conhecimento das regras gramaticais e ortográficas, acesso a novas informações, etc);
3. Promover oportunidades de aprendizado indireto (descoberta de estilos de escrita, formas de expressão, troca de experiências e de informações, compartilhamento de histórias vividas, etc);
4. Promover integração entre os participantes;
5. Promover atividades que ajudem na fixação dos conteúdos, na concentração, na compreensão do texto, através de recursos interessantes, lúdicos e desafiadores.
O que aconteceu até agora
Em seus primeiros encontros a coordenação da Roda de Leitura estimulou as crianças e adolescentes a escolherem um livro para ser lido em grupo. Há divisão por gênero (meninos e meninas) e por faixa etária (9 -12 e 13 - 15).
Há um estímulo para que todos leiam, sem obrigar ninguém a fazê-lo. Ao final, são colhidas as impressões sobre a leitura/compreensão, além de um trabalho de pós-leitura (teatro do texto, escrita de reportagem sobre o encontro, re-escrita do texto com modificações nos comportamentos dos personagens, escrita imaginativa dos capítulos futuros, elaboração de painel com recorte de revista, poesia, concurso sobre a compreensão do texto, debate sobre tema específico, etc.).
Nessa primeira rodada, os meninos escolheram o livro O Menino Maluquinho, do Ziraldo, e as meninas escolheram História de Dois Amores, de Carlos Drummond de Andrade.
Tem sido uma experiência gratificante, mesmo com suas dificuldades.
3 Opiniões:
Fabio, legal o projeto raízes na igreja onde vc congrega. Você vai ver como este trabalho dará muitos frutos. Eu fiz algo assim na minha, mas para as mulheres. Eu as ensinei a fazer tricô, elas passaram a ganhar um dinheirinho e também tricotavam para a família. Até hoje este grupo de maes nao crentes na época foram chegando e ficando de mansinho entre nós.
Atingr os jovens com esporte, música e teatro é maravilhoso. Tenho certeza que este projeto será um sucesso.
A Roda de Leitura é outra idéia maravilhosa e vejo como vocês estao mesmo nao só querendo mas fazendo algo.
Parabéns pelo incentivo.
Obrigada pela participacao, pelo apoio e por este texto brilhante.
Valeu.
Muito boa tua postagem,,valeu!
Beijos
Meire
Valeu fabio !! Tõ acompanhando os programas lá na Zona da Reforma, e sobre o escandalo da foto, um dia apareço ai em alguma gravação de um programa para tirarmos isso a limpo, mas é lógico que acompanhado de uma gelada né rss..
Grande abraço
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